quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Quero ser editado

Com o texto abaixo, meu amigo Trotta homenageou os jornalista, em 7 de abril, "homenagem a cada jornalista que dedica sua vida, sua integridade e trata com respeito a notícia para o seu público".


Já fiz a minha escolha para quando eu morrer. Não quero ser enterrado, mas cremado para ser transformado em pó. Não quero ser guardado em caixinha em cima de alguma cômoda da sala ou em segredo como restos mortais do que fui. Quero deixar aqui o meu derradeiro pedido: que o pó da minha existência seja misturado às tintas de alguma impressora para que eu possa sair impresso na próxima edição do jornal.
Espero não estar dando muito trabalho nessa ocasião, mas quero deixar a sensação de que continuo, de alguma forma, entre as notícias, impregnado nas palavras, oferecendo, numa espécie de esforço, até a última gota. “Ter” a sensação do dever correspondido, estampado e marcado pela identidade de uma vocação, vivida na comunicação. Saber que não mais faço parte de uma coluna, reportagem, ou seja lá o que for, mas do todo. Pertencer a todas as notícias, anúncios, traço, linha, expressão, idéia e pontuação. Começar não apenas como a primeira letra maiúscula de uma frase, mas também pertencer às idéias e chegar até o seu ponto final.
Não mais somente ser do jornalismo, mas pertencer definitivamente ao jornal, a cada folha, a cada página, a cada leitor. Cobrir, in memorian, mais uma edição. Não mais fazer parte da pauta, mas estar, como um todo, em pauta; sentir-me vivo em cada editoria, pulsando nas linhas do editorial. Sentir-me presente no próprio expediente. Consumir-me no jornal, consumado nas informações.
Que cada partícula do pó misturado nas tintas possa ajudar a comunicação, os comunicadores e os leitores a pensarem que a informação e as notícias devem estar a serviço de um mundo justo e cheio de paz. E que tenham a plena consciência de que cada um de nós, por menor que seja, por mais “morto” que pareça estar, tem o poder de mudar o estado das coisas e buscar o impossível, o novo. De descobrir uma nova forma de sobreviver, de se sentir vivo entre os vivos. De reviver, na próxima edição.
Estarei entre substantivos, alguns adjetivos, muitos verbos e entre tantos artigos e pronomes. Serei oração principal e subordinada. Envolto em tintas. Feliz. Completo. Sujeito minha existência. Serei, então, objeto misturado a tantas vidas noticiadas em simples folhas de papel jornal.
Quero ser editado. Levado ao prelo e estampado em cores ou em preto e branco. Estar na forma de anúncio, letras ou na fisionomia dos rostos, gestos e figura de cada foto. Não quero ser notícia, mas estar notícia nas mãos dos meus colegas de trabalho e, depois, ser lido pelos leitores em busca de informações. Quero estar nas linhas e entrelinhas dos textos.
Tornar-me útil, mesmo depois, servindo a muitos dos meus leitores que me liam por dentro e me conheciam por fora. Então, me terão por inteiro, sem máscaras e sem receio, sem limitações, vindo do pó e voltando ao pó, em forma de notícias.
Até a próxima edição!

Antonio Trotta – Jornalista
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