quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Muito além de Além Paraíba

Além Paraíba, na Zona da Mata mineira, é o lugar mais quente do mundo. Pensei isso assim que pus o pé na rua, descendo da van geladinha, e onde estive para trabalhar, por dois dias e meio. Calor e suor escorrendo, em poucos minutos na cidade.
Mas depois percebe-se que nem é tão quente assim, que tem quase um clima de litoral, com uma boa brisa à tarde.

Às margens do rio Paraíba do Sul, a cidade tem duas incongruências, logo à primeira olhada: está na beira do Rio de Janeiro, aonde a gente chega por uma ponte comprida e estreita, a Engenheiro Armando de Godoy, de mão dupla e que trepida que nem betoneira. Guilherme, meu colega de expedição pela cidade, quase desistiu de atravessar.
Do outro lado está Jamapará, distrito de Sapucaia, já no Rio, e onde todo mundo fala cheio de sssss.

A outra é a linha ferroviária que corta toda a cidade, bem na avenida principal e que serve de caminho para os trens da Centro-Atlântica levarem a bauxita de Miraí e região para o porto de São João, no Rio.
É estranhíssimo ver o trem passando, apitando e tocando o sino, dez vezes ao dia (cinco indo e cinco voltando), bem na beira das casas, que em muitos trechos estão a menos de dois metros da linha. Apitando para espantar os carros, bicicletas e até ônibus que estacionam ali em cima dos trilhos.
Mas essa é a beleza de Além Paraíba, que tem no patrimônio ferroviário sua referência de comunidade, de povo, de história.

Descaso e abandono
Pena que as estações estão semidestruídas, como a principal delas, bem no centro da cidade e conhecida como Torreões (Estação de Porto Novo). Exemplo da bela arquitetura pré-modernista, com muitos detalhes e amplo uso do ferro fundido.
Mas o descaso vem fazendo estragos, como o desabamento de parte da rotunda, na mesma estação, no ano passado. Aquilo ali é história pura do povo mineiro e não só da Zona da Mata, pois se trata nada mais, nada menos, do que a Estrada de Ferro Leopoldina, presença constante na literatura e música nacionais ("Samba do Crioulo Doido", Stanislaw Ponte Preta). Nessa estação há um pequeno museu com peças de trens, de cinema, fotos e muitos livros.

Hidrelétrica
Além Paraíba está agora às voltas com a construção da usina de Simplício, megaempreendimento de Furnas, que vai atingir duas cidades mineiras (Além Paraíba e Chiador) e duas do Rio de Janeiro (Sapucaia e Três Rios).
Claro que não se pode negar todo o benefício da obra de 2 bilhões de reais, mas o estrago ambiental é grande. Primeiro com a derrubada de centenas de árvores para as obras de infraestrutura; depois com a movimentação de dezenas de caminhões com terra e materiais diversos, sacudindo a cidade e empoeirandos tudo, azucrinando os mais antigos com tanta barulheira.
E Furnas está sendo acusada de não cumprir os acordos de compensação ambiental, entre eles o de restauração de Torreões e do asfalto da estrada até a usina (distrito de Simplício).

"Adeus, adeus" (debaixo d'água lá se vai a vida inteira Por cima da cachoeira...)
O Paraíba do Sul vai mudar de lugar para o enchimento da barragem. As árvores estão sumindo e as replantadas ainda vão demorar anos para crescer e dar sombra e fazer a troca de CO2.
Daí que quando eu voltar a Além Paraíba em poucos anos, talvez sinta na pele, literalmente, a piada que mais ouvi dos além-paraibanos: "aqui tem três temperaturas: quente, muito quente e excessivamente quente".

Um comentário:

angelinha disse...

Estou procurando parentes em Porto Novo, vc poderia me ajuda?????